CARTA ABERTA AOS BRANCOS PRÓ-MOVIMENTO NEGRO
OS ENTENDIDOS - 30 DE AGOSTO DE 2015
Texto do nosso colaborador, Gabriel Hilair.
Você, pessoa branca, constantemente apresenta a tendência de querer tomar para si o protagonismo de todas as lutas. Acha que pode escrever e falar sobre racismo. Acha que pode lutar lado a lado comigo contra o racismo. Acha que pode falar sobre o quanto o racismo tem impacto na minha vida. Mas, como branco, não tem a menor ideia sobre o que é racismo e, por consequência, não sabe nada sobre a opressão que eu sofro.
Só através do convívio com pessoas negras e ouvindo-as sinceramente acabará compreendendo que não, você não tem a exata dimensão do que é ser negro. Não. Você não sabe o que é viver como negro e nunca vai saber. Você nunca vai compreender exatamente o que é sofrer racismo ou como é crescer e ter que conviver com a sensação de não ter a aparência socialmente aceita.
Por mais revoltante, sem sentido [...] que você ache o racismo. Não sabe nada sobre ele. Simplesmente porque nunca o sofreu. Você pode se indignar com atitudes racistas, com declarações racistas, pode colaborar com a luta contra o racismo, mas jamais colocar-se como protagonista nesse movimento porque, enquanto branco, embora em potencial, você permanece sendo meu opressor.
O racismo, quer você queira, quer você não queira, te beneficia. E, inevitavelmente, em algum momento da sua vida, você vai usar dos seus inúmeros privilégios. Então por que perceber essas questões é tão importante? Para que você não tome o meu lugar de fala, para que você não me silencie, para que você não tente roubar o meu protagonismo.
Você acha que dói em você o racismo. Não dói. Não dói porque quando você entra em um estabelecimento comercial, não é seguido por seguranças e nem desconfiam de você apenas pela cor da sua pele. Sua vivência não é marcada pelo abuso de poder da polícia militar como a de muitos negros, especialmente periféricos, que apanham e são presos e mortos sem causa. Seu psicológico não foi destruído pelas práticas racistas desde os navios negreiros e a baixa autoestima não é inerente ao seu povo. [...]
Apesar de você achar que cor de pele não faz diferença, saiba que ela faz toda a diferença sim. É por causa da sua pele branca que você é aceito pela sociedade e eu não. Ser branco diz respeito apenas à cor da sua pele, mas ser negro, além de dizer respeito à cor da minha pele, diz respeito sobre como as pessoas me veem, à minha autoestima e às minhas experiências como alvo de preconceito e discriminação.
Então, miga, seje menas.
(Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2015/08/30/carta-aberta-aos-brancos-pro-movimento-negro/. Acesso em: 21/1/2016.)
# Questões:
1. É comum as cartas abertas mencionarem no título o assunto ou os interlocutores envolvidos na situação de comunicação em que elas circulam.
a. Na carta aberta lida, o que o título menciona?
b. A quem ela é direcionada?
c. Caso se optasse por um título que indicasse o assunto, qual poderia ser?
d. Não há nessa carta assinatura convencional nem data. Tendo em vista que ela foi publicada em uma página da Internet, levante hipóteses: Por que isso acontece?
e. Levante hipóteses: Caso essa carta tivesse o formato de uma carta pessoal, qual seria a localização da data e da assinatura?
2. Apesar de o título indicar que a carta é direcionada a um grupo de pessoas, o autor trata o destinatário no singular.
a. Identifique no texto pronomes que se referem ao destinatário da carta.
b. Discuta com os colegas e o professor: Qual efeito é criado pela utilização do singular no tratamento do destinatário?
3. Outra estratégia utilizada pelo autor da carta em sua argumentação é contrapor o perfil do seu destinatário ao seu próprio perfil.
a. Identifique no texto pronomes que se referem ao autor da carta.
b. Além da diferença na cor da pele, o autor do texto faz outras contraposições em que inclui ele próprio e o destinatário. Entre as opções a seguir, indique em seu caderno quais estão presentes no texto.
- ricos x pobres
- prepotentes x conscientes
- privilegiados x desrespeitados
- simpáticos x antipáticos
- acolhidos x desamparados
- bonitos x feios
- legitimados x desprestigiados
- polidos x estúpidos
- opressores x oprimidos
4. Ao longo da carta, o autor questiona certo comportamento das pessoas brancas em geral.
a. Qual é esse comportamento?
b. Por que esse comportamento não é aceito pelo autor?
c. O autor explica a importância de as pessoas brancas pró-movimento negro compreenderem seu ponto de vista e mudarem a postura que têm tido. Qual é a mudança que ele propõe?
5. Para construir sua argumentação, o autor faz referência a episódios do cotidiano vividos por negros e não vividos por brancos. Quais são esses episódios?
6. Discuta com os colegas e o professor e explique: Por que a construção da oposição eu/negro × você/branco, na carta, inverte a perspectiva de que os negros são sempre subjugados aos brancos, mencionada pelo autor?
7. A carta em estudo foi escrita em uma variedade linguística que, em alguns momentos, se aproxima mais da fala. Releia os trechos a seguir e indique quais são mais próximos da fala e quais são mais próximos da escrita.
a. "Acha que pode lutar lado a lado comigo"
b. "constantemente apresenta a tendência de querer tomar para si o protagonismo"
c. "como branco, não tem a menor ideia"
d. "você não tem a exata dimensão do que é ser negro"
e. "quer você queira, quer você não queira"
f. "Você acha que dói em você"
g. "Simplesmente porque nunca o sofreu"
h. "É por causa da sua pele branca que você é aceito"
i. "Ser branco diz respeito apenas à cor de sua pele"
8. Releia a última frase da carta:
"Então, miga, seje menas."
a. Por que é possível considerar que a variedade utilizada nesse trecho destoa do restante do texto?
b. Levante hipóteses: Por que o autor optou por escrever apenas esse trecho dessa maneira?
c. Como ficaria a frase em uma variedade que seguisse a norma-padrão?
d. Compare a frase correspondente à resposta do item anterior à frase do texto e conclua: Que efeito de sentido o uso dessa variedade produz no texto?
Muito obrigado
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